Pesquisas feitas pela Fiocruz,
em parceria com as organizações não governamentais ACT Promoção da Saúde e
Vital Strategies, estimam o custo que o consumo de alimentos ultraprocessados e
bebidas alcoólicas tem sobre o sistema público de saúde no país. A partir de
dados de atendimentos realizados pelo Sistema Único de Saúde (SUS),
levantamentos mostram que a má alimentação com ultraprocessados leva a R$ 933,5
milhões por ano em gastos diretos com saúde, um total de R$ 10,4 bilhões
se considerados custos indiretos e de mortes prematuras, e R$ 18,8 bilhões em
relação ao consumo de bebidas alcoólicas.
As estimativas não incluem dados
de atendimentos na rede suplementar de saúde (planos de saúde e clínicas
particulares fora do SUS), nem atendimentos que não tenham esses agentes como
principal causa relacionada.
Os estudos indicam a necessidade
de combinação de estratégias para diminuir o impacto, com uso de impostos
seletivos, aumentando o custo de produtos que tenham esse potencial contra a
saúde pública, de forma transparente e relacionada a campanhas de
conscientização como as de combate ao tabagismo.
“Esses impostos seletivos têm,
além do potencial de financiar o tratamento do que os produtos causam, o efeito
de reduzir o consumo de substâncias nocivas e estimular escolhas mais
saudáveis. Em longo prazo, há também um caráter progressivo associado, com a
redução de custos no sistema de saúde e a diminuição da perda de produtividade
e de doenças que reduzem a expectativa de vida”, explicou Marília Albiero,
coordenadora de Inovação e Estratégia da ACT Promoção da Saúde.
As ONGs promovem campanha pela
inclusão desse tipo de imposto na reforma tributária, como estratégia casada de
promoção à saúde e financiamento de políticas de justiça tributária.
“Em um país que tem enfrentado
dificuldades de equacionar receita e despesa nos últimos 10 anos, num momento
em que se tem uma pressão muito grande de financiamento do SUS e uma reforma
tributária que precisa ser equacionada do ponto de vista de alíquota adequada e
de quem paga a conta da limitação dessa alíquota, é preciso entender que alguns
setores que causam mais custo para a sociedade podem pagar essa conta, e que
ela funciona em uma lógica de ganha-ganha: não só arrecada mais, como pensa uma
lógica de tributação específica para garantir políticas necessárias a partir do
ganho desse setor”, defendeu Pedro de Paula, diretor da Vital Strategies no
Brasil.
A lógica do lobby é a de que o
consumo pouco controlado desses produtos esconde o impacto no aumento de
doenças comuns e debilitantes, como a hipertensão, o diabetes e a obesidade,
que estão entre os principais causadores de perda de produtividade por questões
associadas à saúde e entre os fatores determinantes para o surgimento de
doenças mais complexas, como demências e cânceres. Além disso, podem ser o
caminho para construir sistemas de apoio à agricultura familiar e à
distribuição de alimentos in natura, estabelecendo, a partir de combinação de
medidas, “uma mudança estrutural do sistema tributário, atuando como
instrumento para promover saúde, equidade e sustentabilidade”, completou
Albiero. Riscos associados
Os estudos indicam ainda que as
doenças relacionadas ao consumo de ultraprocessados e álcool causam,
respectivamente, impacto de 57 mil e de 105 mil mortes por ano. Ainda que o
aumento da taxação não vá impedir o consumo excessivo em sua totalidade, há
grande potencial de diminuição dessas mortes, estimadas inicialmente em cerca
de 25%, ou seja, quase 40 mil vidas por ano, além de ganho na qualidade de
vida.
Uma comparação feita pelos
pesquisadores é com os investimentos recorrentes, e necessários, contra doenças
transmissíveis, como a dengue. As campanhas anuais tendem a salvar vidas em
patamar de milhares, cerca de duas mil por ano. Uma diferença gritante, quando
posta em perspectiva tal disparidade.
“Vale lembrar que essas
estimativas são conservadoras, visto que se limitam ao impacto na população
empregada adulta, maior de 20 anos, e não incluem outros custos de prevenção,
atenção primária, saúde suplementar ou gastos particulares no tratamento das
doenças causadas pelo consumo de ultraprocessados”, afirmou Eduardo Nilson,
pesquisador da Fiocruz, responsável pelos estudos. São, portanto, uma leitura
do cenário a partir dos dados públicos disponíveis. Propositalmente, foram
bastante criteriosos, excluindo danos colaterais e cenários relacionados a
outros fatores de risco.
Sobre o álcool, que é base para a
campanha publicitária “Quer uma dose de realidade?" o estudo buscou
entender a percepção pública a respeito da taxação. Os resultados de uma
pesquisa por meio de questionários, com cerca de mil participantes, estimou que
62% dos brasileiros apoiam o aumento de preços e 61% são a favor de impostos
para reduzir o consumo de álcool. Para 77% das pessoas ouvidas, o governo é
responsável por combater os danos relacionados ao álcool.
“A gente está falando de 105 mil
mortes. Qual é o custo social disso, do ponto de vista de saúde mental, de
desesperança, quando você está falando de violência e insegurança pública
decorrente dessa violência? Dá até, em longo prazo, para a gente começar a
pensar em qualificar essas estimativas. Mas é exatamente isso, tem setores que
causam danos para a sociedade e eles devem arcar com esses custos de forma
adequada”, completou Pedro de Paula.
O estudo apontou ainda a
diminuição potencial de riscos associados com grande difusão na sociedade, como
o impacto do álcool na violência doméstica e na gravidade de acidentes de
trânsito.
Fonte: Jornal do Commercio.
Nenhum comentário:
Postar um comentário