Bloqueio da PRF e minuta golpista: entenda os argumentos de Fux para absolvição de Bolsonaro


 

O ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), contestou ao votar nesta quarta-feira (10) provas que, segundo a Procuradoria-Geral da República, ligam o ex-presidente Jair Bolsonaro a fatos da trama golpista.

O integrante da Primeira Turma divergiu do relator e votou pela absolvição do ex-presidente em relação aos cinco crimes trazidos na denúncia.

Confira os principais argumentos trazidos pelo ministro:

Relatório das Forças Armadas

O ministro disse não ter visto dolo na pressão feita por Bolsonaro sobre o então ministro da Defesa Paulo Sérgio Nogueira em relação ao relatório de análise do sistema eletrônico de votação, conforme consta no processo.

Na denúncia, a PGR afirmou que o ex-presidente interferiu no relatório elaborado pelas Forças Armadas. Na época, o relatório foi enviado à Justiça Eleitoral falando sobre o trabalho de fiscalização do sistema eletrônico de votação, mas depois a pasta publicou uma nota dizendo que não havia sido descartada a possibilidade de fraude.

— A absoluta ausência de lesividade desse episódio é reconhecida pelo próprio Ministério Público, que diminuiu a sua importância ao afirmar que a ação não foi exitosa. (...) Ainda que se considerasse uma conduta capaz de suprimir o estado democrático de direito, os elementos dos autos também indicam não ter havido o dolo de atentar contra as instituições — disse Fux.

Bloqueios da PRF

Fux ressaltou que não há nenhuma prova que Bolsonaro sabia dos bloqueios da Polícia Rodoviária Federal montados durante as eleições de 2022:

— O Ministério Público em momento algum apresentou provas da ciência ou participação de Jair Bolsonaro nos fatos — disse.

8 de janeiro

O ministro afirmou que Bolsonaro não pode ser responsabilizado por crimes cometidos por terceiros.

— Não se pode aceitar a pretensão acusatória de se imputar ao réu a responsabilidade por crimes cometidos por terceiros no fatídico 8 de janeiro de 2023 como decorrência de discursos e entrevistas ao longo do mandato — pontuou.

Sem "autogolpe"

Fux entendeu que não cabe condenar Bolsonaro por tentativa de golpe de Estado por ações tomadas quando ele ainda estava no cargo de presidente da República. Conforme o ministro, não seria possível que o ex-presidente tentasse depor o próprio governo.

— As condutas praticadas pelo réu durante seu mandato como Presidente da República não podem configurar o crime previsto no 359-M do Código Penal [tentar depor, por meio de violência ou grave ameaça, o governo legitimamente constituído], pois este pressupõe a prática de conduta tendente a remover o mandatário do cargo ocupado, e era ele o mandatário do cargo ocupado — frisou.

Urnas eletrônicas
O ministro afirmou que os ataques de Jair Bolsonaro às urnas “não configuram tentativa de abolição do estado democrático de direito”. Segundo ele, ainda que haja questionamentos sobre a regularidade do sistema de votação, "a simples defesa da mudança do sistema de votação não pode ser considerada narrativa subversiva".

Ao comentar sobre o histórico de críticas ao processo eleitoral, Fux acrescentou que “sempre ocorreram questionamentos e discursos inflamados, de políticos de direita ou esquerda".

O ministro afirmou, ainda, que Bolsonaro não pode ser culpado por questionar as urnas:

— Não se trata da primeira vez que candidato à Presidência da República provoca o TSE contra a regularidade das eleições.

Carta aos comandantes

Fux disse que a PGR também não conseguiu provar que Bolsonaro sabia da Carta aos Comandantes, cujo conteúdo pressionava os chefes das Forças Armadas a aderirem ao golpe de Estado.

— A única prova da ciência do réu Jair Bolsonaro sobre a carta em questão consiste em mensagens trocadas entre Mauro Cid e Sergio Cavalieri, em que o segundo pergunta se o primeiro sabia disso. E o primeiro diz "sim". Essa prova tênue é completamente insuficiente para demonstrar uma participação dolosa quanto à elaboração da carta.

Minuta golpista

Ao tratar da chamada minuta golpista, o ministro Luiz Fux afirmou que o documento apresentado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) possui “contradições e falhas” que, em sua avaliação, tornam a acusação “insustentável”. Ele disse, ainda, que Bolsonaro "está sendo acusado por um documento cujo teor exato não é conhecido".

Fux destacou que o documento, que teria sido levado a Bolsonaro pelo ex-assessor Filipe Martins e que previa a prisão de autoridades e a convocação de novas eleições, não consta nos autos.

— A minuta narrada pelo Parquet (PGR) prevendo a prisão de autoridades e a convocação de novas eleições, que teria sido que teria sido entregue diretamente ao réu Jair Bolsonaro, não veio aos autos em momento nenhum — disse.

O ministro ressaltou ainda que, para transformar a mera cogitação em atos executórios de caráter golpista, seria necessária uma cadeia de medidas, como a publicação de decreto presidencial, o envio de mensagem aos órgãos operacionais das Forças Armadas e "a edição de ato formal para transferir o controle operacional dos órgãos de segurança pública".

Fux também citou depoimentos do ex-ajudante de ordens Mauro Cid, que teria dito que Bolsonaro discutiu versões da minuta, mas não deu andamento ao plano. O ministro citou, ainda, a informação trazida por Cid de que Bolsonaro teria "enxugado" a minuta, retirando, por exemplo, a previsão de prisão de algumas autoridades. Conforme Fux, essa versão enxuta do documento não consta nos autos.

Para o ministro, embora Bolsonaro tenha aventado hipóteses como decretação de estado de sítio ou operação de garantia de lei e ordem, mas que as ideias não foram implementadas.

— Nada disso saiu da mera cogitação.

Punhal Verde Amarelo

O ministro afirmou que não há provas de que o plano intitulado "Punhal Verde e Amarelo" foi apresentado ao ex-presidente. O plano em questão previa, segundo a investigação, o monitoramento e assassinato do ministro Alexandre de Moraes, além da eliminação do presidente Lula e do vice-presidente Geraldo Alckmin.

O documento teve a sua autoria reconhecida pelo general Mário Fernandes, réu no processo e que chegou a assumir o cargo de ministro da Secretaria-Geral da Presidência sob Bolsonaro. Fernandes imprimiu o documento no Palácio do Planalto e, segundo investigação, no dia seguinte às impressões, o general foi ao Palácio da Alvorada, onde Bolsonaro ficou recluso nos meses finais de seu governo.

— As provas apresentadas pela acusação são insuficientes para demonstrar que essa minuta, em algum momento, chegou a ser apresentada ao réu Jair Bolsonaro, muito menos que tenha contado com a sua anuência.

Acampamentos
No voto, o ministro Luiz Fux afastou a tese de que Jair Bolsonaro tivesse liderança ou controle sobre os manifestantes que participaram dos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023 e que ficaram nos acampamentos instalados em frente a quartéis.

— Segundo a própria peça ministerial, o coronel Muro Cid falou: 'Não, o presidente nunca deu nenhuma orientação para mim com relação aos manifestantes, eu não tinha contato com nenhum manifestantes, (...) nem com ninguém nos acampamentos em frente aos quartéis'. Cid igualmente disse que Jair Bolsonaro nunca mobilizou os manifestantes.

Críticas à PGR

Além dos pontos relativos ao ex-presidente Fux criticou a acusação em alguns momentos ao longo do voto. Em determinado momento, afirmou que a narrativa é "desprendida dos fatos":

— A petição do Ministério público não me pareceu cuidar de realizar uma descrição típica, individualizada, das condutas dos agentes, preferindo adotar uma narrativa, que me pareceu desprendida da cronologia dos fatos alegados.

Fonte: Folha de Pernambuco.

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