A depressão pós-parto afeta cerca
de uma em cada sete mulheres que dão à luz, mas pouco se sabe sobre o que
acontece no cérebro das gestantes que a vivenciam. Um novo estudo começa a
lançar alguma luz.
O Globo traz hoje a terceira
edição de um projeto para ajudar você, leitor, a se cuidar ainda melhor. A cada
mês, publicaremos conteúdos exclusivos, todos os dias ao longo de uma semana,
sobre um problema de saúde. Essa semana é a depressão.
Você pode participar mandando suas questões sobre a depressão. As perguntas selecionadas serão respondidas pelo psiquiatra Luiz Zoldan, gerente médico do Espaço Einstein de Saúde Mental e Bem-Estar, e publicadas na próxima quinta-feira. Mande suas perguntas para o e-mail: pergunteaodr@oglobo.com.br.
No caso da depressão pós parto,
os pesquisadores examinaram os cérebros de dezenas de mulheres nas semanas
anteriores e posteriores ao parto e descobriram que duas áreas cerebrais
envolvidas no processamento e controle das emoções aumentaram de tamanho em
mulheres que desenvolveram sintomas de depressão pós-parto.
Os resultados, publicados na
quarta-feira na revista Science Advances, constituem algumas das primeiras
evidências de que a depressão pós-parto está associada a alterações no cérebro
durante a gravidez.
Pesquisadores descobriram que
mulheres com sintomas de depressão no primeiro mês após o parto também
apresentaram aumento no volume da amígdala, uma área do cérebro que desempenha
um papel fundamental no processamento emocional. Mulheres que classificaram sua
experiência de parto como difícil ou estressante — uma percepção frequentemente
associada à depressão pós-parto — também apresentaram aumento no volume do
hipocampo, uma área do cérebro que ajuda a regular as emoções.
— Este é realmente o primeiro
passo para tentar entender como o cérebro muda em pessoas que têm uma gravidez
normal e, em seguida, naquelas que sofrem de depressão perinatal, e o que
podemos fazer a respeito — diz Sheila Shanmugan, professora assistente de
psiquiatria, obstetrícia-ginecologia e radiologia da Universidade da
Pensilvânia, que não participou do estudo. — As grandes conclusões são sobre
como ocorrem essas mudanças cerebrais realmente profundas durante a gravidez e
como agora estamos observando isso especificamente nos circuitos da depressão.
O estudo foi conduzido em Madri
por uma equipe que liderou esforços para documentar os efeitos da gravidez no
cérebro. Faz parte de um crescente corpo de pesquisas que descobriu que certas
redes cerebrais, especialmente aquelas envolvidas no processamento social e
emocional, encolhem durante a gravidez, possivelmente passando por um processo
de ajuste fino em preparação para a parentalidade. Essas mudanças correspondem
a picos nos hormônios da gravidez, especialmente o estrogênio, e algumas duram
pelo menos dois anos após o parto, descobriram os pesquisadores.
O novo estudo parece ser o
primeiro a escanear e comparar áreas do cérebro durante a gravidez e após o
parto, relacionando as alterações à depressão pós-parto, conta Elseline
Hoekzema, neurocientista que chefia o Laboratório de Gravidez e Cérebro do
Centro Médico Universitário de Amsterdan e que não participou do estudo.
Os autores do estudo e outros
pesquisadores afirmam que não está claro se o aumento do volume da amígdala e
do hipocampo desencadeou sintomas depressivos e percepções de estresse durante
o parto ou se as alterações cerebrais estavam ocorrendo em resposta a sintomas
e fatores estressantes. Também não ficou claro, a partir dos exames cerebrais,
por que algumas mulheres pareciam ser mais vulneráveis a isso do que outras.
— Pode ser que as pessoas cuja
amígdala é mais suscetível a alterações também corram maior risco de sofrer
depressão pós-parto — afirma a autora sênior do estudo, Susana Carmona,
neurocientista que lidera o Laboratório Neuromaternal do Instituto de
Investigación Sanitaria Gregorio Marañón, em Madri. — Também pode ser o
contrário, que, de alguma forma, esses sintomas de depressão produzam um
aumento no volume da amígdala.
Os pesquisadores estudaram 88
gestantes que nunca haviam dado à luz e que não tinham histórico de depressão
ou outras condições neuropsiquiátricas. Para um grupo controle, também
analisaram 30 mulheres que não estavam grávidas. As gestantes foram submetidas
a exames cerebrais durante o terceiro trimestre e cerca de um mês após o parto.
As mulheres responderam a
questionários padrão para avaliar se apresentavam sintomas de depressão
pós-parto. Após o parto, 15 mulheres apresentaram sintomas moderados de
depressão e outras 13 apresentaram sintomas de depressão graves o suficiente
para justificar a procura por ajuda médica, conta Carmona.
As mulheres também responderam a
questionários sobre se consideravam sua experiência de parto difícil. Estudos
anteriores mostraram que “uma experiência de parto negativa está associada a
aumentos nos índices de depressão”, afirma Carmona. Ela disse que experiências
difíceis de parto não eram necessariamente partos desafiadores do ponto de
vista médico, mas poderiam ser partos sem complicações que as mulheres
percebiam como estressantes devido a fatores como funcionários rudes do
hospital.
Laura Pritschet, uma pesquisadora
de pós-doutorado em psiquiatria na Universidade da Pensilvânia que não estava
envolvida no estudo, chamou os resultados de "realmente fascinantes",
acrescentando que eles apontam o caminho para pesquisas futuras "tentando
descobrir quais áreas do cérebro estão mudando mais em relação a uma variedade
de desfechos após o parto, como humor, ansiedade e depressão".
Pritschet, que escreveu um artigo
com Shanmugan na mesma edição do periódico que defende pesquisas para
determinar assinaturas cerebrais individualizadas da depressão perinatal, disse
que as descobertas do novo estudo ajudam a identificar um roteiro para, eventualmente,
melhorar a previsão, o diagnóstico e o tratamento da depressão pós-parto.
"Se rotineiramente mostramos
que certas áreas do cérebro estão implicadas, o que fazemos? Como podemos
intervir precocemente?” questiona. “Qual é a quantidade normal de alteração?
Por que essa área pode ser vulnerável? Muitas perguntas interessantes para
fazer a seguir.”
Fonte: Folha de Pernambuco.


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