Um
levantamento divulgado nesta semana pela Sociedade Brasileira de Pediatria
(SBP) revela que, diariamente, cerca de 196 crianças e adolescentes dão entrada
em unidades de saúde do País após sofrerem algum tipo de violência.
Segundo os
pesquisadores, foram registradas 71.598 internações envolvendo pessoas de 0 a
19 anos ao longo de 2023 - isso considerando apenas os casos nos quais houve
intervenção médica e internação de 24 horas ou mais, que costumam ser mais
graves.
Desse total,
mais de 3 mil notificações envolveram bebês com menos de um ano e 8.370 foram
relacionadas a crianças de 5 a 9 anos.
Os
adolescentes de 15 a 19 anos foram as principais vítimas, com 35.851
notificações (50%) no Sistema Nacional de Agravos de Notificação (Sinan) do
Ministério da Saúde, base de registros usada no estudo.
Sinais da
violência
Presidente
da SBP, o médico Clóvis Francisco Constantino indica que as agressões durante a
infância são, na maioria das vezes, físicas. Já entre adolescentes e jovens
prevalece a violência sexual.
As agressões
que vitimam os mais velhos podem ser confirmadas com a ajuda de relatos,
enquanto, nas crianças mais novas, a violência é percebida principalmente
confrontando a lesão com a história informada pelos cuidadores, diz
Constantino.
"Às
vezes, os pais chegam no pronto-socorro dizendo que o bebê rolou da cama e
caiu, mas ele tem muitos traumas em várias regiões do corpo que seriam
incompatíveis com uma queda da cama", exemplifica.
Além disso,
mesmo que os ferimentos estejam concentrados em uma região, com exames é
possível perceber feridas mais antigas, em processo de cicatrização, o que pode
sinalizar agressões frequentes.
Nessas
situações, o profissional de saúde tem o dever de informar as autoridades,
especialmente o Conselho Tutelar, para que este possa examinar a vivência
familiar e se o lar é seguro para a criança.
"Tanto
a recomendação do Ministério da Saúde quanto o Estatuto da Criança e do
Adolescente colocam ser dever legal relatar a simples suspeita, mesmo que ainda
não haja a constatação, de sinais e indícios de agressões sexuais ou
físicas", afirma.
Subnotificação
dos casos
Ainda assim,
o pediatra crê que os números diários sejam maiores, visto que foram analisadas
apenas notificações provenientes de hospitais e prontos-socorros.
"Infelizmente, temos lugares mais remotos e com pouco acesso à saúde, o
que dificulta essa notificação dos médicos, por exemplo."
Para o
especialista, o contingente populacional de São Paulo pode ser um dos motivos
para o Estado figurar no ponto mais alto do ranking, com 17.278 internações
(24% do total), uma média de 47 casos por dia.
Em seguida,
aparecem Minas Gerais, com 12% das ocorrências (média de 23,5 registros por
dia), e Rio de Janeiro, com 10% (cerca de 21 casos por dia).
Na outra
ponta, os quatro Estados com menor número de notificações são da região Norte.
Amapá, Roraima, Rondônia e Acre, juntos, somaram 1.317 notificações no ano
passado (média de 3,6 casos por dia).
"Essa
queda na região Norte pode estar relacionada tanto à dificuldade de acesso aos
serviços de saúde quanto à ausência de mecanismos eficazes de denúncia",
aponta o presidente da SBP. O Pará (2.357 notificações) e o Amazonas (1.398)
ficaram, respectivamente, em 9º e em 14º lugar.
Na região
Sul, o Paraná se destacou com 7.266 casos. A Bahia teve o maior número do
Nordeste, com 3.496 ocorrências, e Goiás, do Centro-Oeste, com 2.533. Neste
último Estado, 70% dos casos ocorreram entre vítimas de 10 a 19 anos.
Agressões
dentro de casa
Para tentar
reduzir a subnotificação, foi lançado em setembro, na Universidade São Paulo
(USP), o projeto Laboratório de Violência, Vulnerabilidade e Saúde (LVVH). A
ideia é detectar casos suspeitos e não notificados cruzando dados de diferentes
bases, incluindo o Sinan e o Sistema Integrado de Gestão de Assistência à Saúde
(Siga).
"Será
um trabalho de inteligência sobre os bancos de dados decorrentes dos registros
da Saúde, Assistência Social e do sistema de Segurança, quando possível",
diz Linamara Rizzo Battistella, professora titular da USP e pesquisadora
responsável pelo laboratório.
Outra
expectativa do grupo é dar visibilidade ao tema para que este deixe de ser tabu
nas famílias, onde ocorre a maioria dos casos. Dados divulgados pelo Ministério
da Saúde apontam que, apenas no primeiro semestre de 2021, o Disque 100 recebeu
50.098 denúncias de violência contra crianças e adolescentes. Desse total,
40.822 casos (81%) ocorreram dentro da casa da vítima e a mãe foi a principal
violadora, com 15.285 denúncias. Em seguida, vieram o pai, com 5.861;
padrasto/madrasta, com 2.664; e outros familiares, com 1.636 registros.
"A violência
tem um caráter familiar e social muito importante, então o conjunto dos dados
dos parentes, traços socioeconômicos, culturais e escolares que vão nos ajudar
a prever o risco dessa criança estar submetida a qualquer nível de violência,
mas sobretudo à sexual", afirma a professora.
Como
denunciar a violência contra crianças e adolescentes
- Em contato
com a Polícia Miliar pelo 190;
- Pelo
Disque 100, que recebe denúncias anônimas de violação de direitos humanos;
- Via
Conselho Tutelar, órgão encarregado por zelar pelo cumprimento dos direitos das
crianças e adolescentes. No município de São Paulo, são 52 Conselhos,
distribuídos pelas cinco regiões. Veja aqui a lista com os endereços e
telefones;
- Em
delegacias.
Fonte: Folha
de Pernambuco.
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